quarta-feira, 4 de março de 2009

A Edição de Livros e a Gestão Estratégica - excertos da obra (III)

[Continuação]

Martyn Daniels referiu recentemente que a edição é uma «indústria complexa e diversa. Por vezes, argumenta-se que, na verdade, se trata de diversas indústrias que apenas se juntaram graças a um formato comum, o livro.» Essas indústrias estariam agora a divergir em virtude de oportunidades como PoD e digitalização (e-books). Há quem considere que isso «anuncia o fim do editor e do retalhista generalistas e promove os especialistas, quer em termos de desenvolvimento de conteúdos e direitos e sua venda ao canal, quer em termos do consumidor final. Outros poderão vasculhar os diferentes modelos de edição e tentar prever os que virão a falhar ou a ter sucesso. Mas a edição é, e continuará a ser, diversa e complexa e a única coisa de que pode-mos estar certos é que não existem soluções mágicas e que o futuro não é binário» (Daniels, 2008). Verifica-se, portanto, que o sector da edição não foi imune, como seria de calcular, às mudanças ambientais, e que também ele se encontra em fase de mudança e de incerteza. Tenta-remos, pois, identificar algumas das alterações entretanto ocorridas, que colocam sérias questões ao negócio tradicional.

Valerá assim a pena observar, ainda que brevemente, o estudo The EU Publishing Industry: An assessment of competitiveness, elaborado para a Comissão Europeia pela PIRA International em 2003. O relatório tinha um âmbito alargado, pois destinava-se a examinar a competitividade dos sectores da edição de livros, revistas científicas e académicas, jornais, manuais e guias e revistas em geral, entendidas no seu todo como a indústria da edição (que também virá, ao longo do trabalho, a ser designada como indústria de conteúdos). Dividido em duas partes, a primeira consistia numa avaliação da actual posição competitiva das indústrias da edição na União Europeia, enquanto a segunda se preocupava com os factores que viriam a ser relevantes para determinar a futura competitividade da indústria.

Para o que aqui nos importa, encontramos de imediato uma posição muito clara:

«Para tentar descrever as indústrias de conteúdos, as “value and supply networks” são um instrumento mais apropriado do que as convencionais “cadeias de valor” para analisar as relações complexas entre actividades, criação de valor, tecnologias de desenvolvimento e os diferentes agentes económicos que existem nessas indústrias. As empresas de criação de con­teúdos e de distribuição têm agora muito mais oportunidades para a exploração do conteúdo graças aos avanços tecnológicos.» (PIRA International, 2003: 6)

Reconhece-se, assim, que as variáveis de contexto tornaram cada vez mais difícil adaptar as estruturas das indústrias dos média e dos conteúdos à forma da cadeia de valor tradicional e propõe-se um novo framework, as análises da rede de valor e supply-network-based, para abarcar a complexidade das empresas comerciais e das iniciativas e relações que as suportam. Trata-se, na realidade, de seguir a abordagem de Normann e Ramirez (1994), que analisam os «sistemas de criação de valor» em que uma «constelação de agentes trabalham em conjunto para “co-produzir” valor», como veremos mais adiante. Esta abordagem permite aos players já estabelecidos e aos novos agentes identificar o modo como os fornecedores, parceiros de negócio, aliados e consumidores podem ser coreografados para desenvolverem novas propostas de valor.

É certo que as indústrias de conteúdos foram tradicionalmente caracterizadas como cadeias de valor e de abastecimento lineares e são, com frequência, fortemente integradas. Mas a «proliferação de dispositivos por parte do consumidor e o aparecimento de redes “abertas” de elevada capacidade abriram caminho para relações mais complexas e permitiram às empresas, particularmente às envolvidas na criação e distribuição de conteúdos, disporem agora de mais hipóteses de exploração do conteúdo». Assim, onde a cadeia de valor sublinhava as oportunidades de desintermediação, a análise das redes de valor e de abastecimento aponta para a criação de novos intermediários, combinando recursos, activos e conhecimento e informação significativos de uma variedade de organizações, para criar novas propostas de valor e para servir como ponto de foco para novas relações com o consumidor. As redes de valor mostram como diferentes tipos de conteúdo são cada vez mais utilizados pelos serviços digitais.

[Continua]

Retirado das páginas 219-221: capítulo 5, «Transformações no sector da edição de livros».

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