Editorial
À FNAC se deve muita da democratização do livro. Abriu portas no nosso país há dez anos, tendo-se instalado no leitor a ideia de que, confortavelmente sentado num sofá, podia folhear-se sem comprar, consultar sem ser visto de soslaio pelo livreiro, que se certificava se não levávamos indevidamente um livro debaixo do braço.
Equipada com bons profissionais, livreiros a sério, entrava-se na FNAC e percebia-se que quem estava do outro lado do balcão sabia do que falava. Uma forte actividade cultural convidava a dar lá um salto para ver o que ocorria. Tudo acompanhado de um café ou de uma bebida. Paralelamente, e com a implementação da Lei do Preço Fixo, o preço FNAC (redução de 10% sobre o preço de editor) foi também uma das características que fez com que a compra de livros passasse a ser efectuada naquelas lojas. Desvalorizaram-se as livrarias, ditas independentes, algumas impregnadas de vícios que ainda tardam a desaparecer, e passou-se a comprar bastante na FNAC.
Com o evoluir dos tempos, a actividade cultural passou a fazer parte do dia-a-dia das livrarias independentes (veja-se, a título de exemplo, a Pó dos Livros, em Lisboa, a Loja 107, nas Caldas da Raínha, ou a livrododia, em Torres Vedras), as cafetarias instalaram-se em muitos destes espaços, e os que quiseram sobreviver e continuar a ser respeitados, lutaram por encontrar o seu espaço. Veja-se a Ferin, fortíssima nos álbuns e no livro importado, com um serviço ao cliente absolutamente irrepreensível.
Faltava o preço para competir com a FNAC. Os livreiros tradicionais, sujeitos a descontos inferiores por parte das editoras, por não representarem o mesmo do que a FNAC em termos de negócio, viam-se impossibilitados de praticar o desconto do armazenista francês. Observa-se agora que a FNAC parece preparar-se para abandonar esta política de preços. Assim, apenas os portadores dos cartões poderão usufruir dos 10% de desconto que, presume-se, continuarão a ser suportados pelos editores. Os outros clientes pagarão o mesmo preço praticado numa livraria independente.
Por tudo isto, fica uma pergunta: se não se possuir um cartão FNAC, qual o motivo para se continuar a ir lá comprar livros?
(pf)