sexta-feira, 18 de abril de 2008

Entrevista: Manuel Alberto Valente

Hoje, no Público - página 16, uma entrevista de Isabel Coutinho a Manuel Alberto Valente, editor que, após a saída da Asa, se encontra a preparar um novo projecto editorial. Alguns excertos:

PÚBLICO - Quando se demitiu das Edições Asa, não quis revelar as razões que o levaram a abandonar o grupo Leya. Pode fazê-lo agora?
Aquilo que me levou a siar foi um enorme desencanto profissiona. Poder-se-á pensar que é uma posição contra a concentração editorial, mas, à partida, não tenho nada contra os grupos nem contra a concentração. Temos que fazer uma distinção clara entre grupos que são do livro e grupos que não o são. Concretizando: a Bertelsmann ou a Porto Editora são grupos do livro, nasceram e viveram com o livro toda a vida.

(...)

Desencanto profissional porquê?
Quando a Asa foi comprada, pensei que o grupo Leya ia trazer à Asa, por um lado, dinheiro, mas, por outro lado, organização, eficácia, profissionalismo. Portanto, olhei com muito optimismo e com uma boa expectativa a entrada da Asa no grupo. Curiosamente, o que a prática me veio a revelar foi que dinheiro passou a haver, efectivmente, mas tudo o resto era mentira. a desorganização é completa, a falta de eficiência é completa, a falta de profissionalismo é completa. A Asa antiga era um mimo de organização e de excelência de trabalho comparada com aquilo em que a Asa foi transformada.

Não foram então questões de opção editorial.
Embora aí também houvesse desinteligências. Foi realmente ver-me rodeado de uma falta de eficácia, de organização e de profissionalismo com o qual não podia pactuar. Ajudei durante 17 anos a construir a Asa, não podia ser cúmplice da sua destruição. É um desencanto muito grande quer com as políticas editoriais que estão a ser seguidas, quer com a falta de competência profissional da maior parte dos quadros que entraram para a estrutura com a constituição do grupo.
(...) Isaías Gomes Teixeira (...) no momento em que me despedi, disse-me que compreendia perfeitamente que um homem que tinha idade para ser pai dele já não se adaptava a estas novas dinâmicas do mundo editorial. É um bocado verdade.

(...)

Uma das inovações da Leya foi a integração de um gestor de marca a acompanhar o editor.
Essa é uma ideia contra a qual não tenho nada, isto se os gestores de marca escolhidos fossem pessoas habilitadas a cumprir esse papel. O que acontece é que, pelo menos em alguns casos, as pessoas que foram escolhidas como gestores de marca não têm a mínima ideia do negócio editorial e, portanto, não estão em condições de poder cumprir as suas funções.

Abandonou o grupo Leya por sua própria vontade, não recebeu indemnização, não negociou a sua saída. E agora?
Tenho estado a construir um projecto que quero que seja consistente, de qualidade, de excelência. E há duas hipógteses: ou avanço para esse projecto sozinho, ou encontro um interlocutor que o aceita e inclui numa estrutura editorial já forte. Como é ambicioso, gostava de o ver integrado numa estrutura que lhe desse garantias de eficácia.

Pode ser mais concreto?
É um projecto editorial que passa pela publicação de autores portugueses e de obras traduzidas na área da ficção e da não-ficção. Não é para publicar os restos do que sobra dos grandes grupos. Quero que seja um projecto concorrente dos grandes grupos. Quero publicar livros já este ano, na rentrée, em Setembro.

São livros que já estavam acordados?
Não posso trazer das Edições Asa livros previstos no seu programa editorial e que já estavam contratados. Mas autores posso. Desde que os autores não tenham contratos assinados para obras novas, evidentemente que os posso trazer. E conto com eles, aliás, quer portugueses, quer estrangeiros.»