quarta-feira, 13 de maio de 2009

PORTO EDITORA NO JL

O JL publica na sua última edição um artigo dedicado à Porto Editora, que aqui reproduzimos.

"Porto Editora

A ‘ciência’ dos livros
A entrada na Literatura é recente, mas a actividade editorial é antiga, no sector dos manuais escolares, livros de referência e dicionários. Em meados dos anos 90 aventurou-se pelo multimédia, depois afir­mou-se no mercado português e expandiu-se para o africano. Com um catálogo de 3200 títulos e um volume de vendas que em 2008 atingiu 91,5 milhões de euros, com um crescimento de 5,5%, a Porto Editora, dá emprego a 700 trabalhadores, tendo já contribuído com os seus livros para a formação de milhões de portugueses. A empresa familiar com sede na cidade nortenha cumpriu 65 anos no passado dia 2, assinalando o aniversário na Feira do Livro de Lisboa.

Líder nas áreas da Educação, Refe­rência e Multimédia, está a entrar na idade da reforma mas não ten­ciona aposentar-se. Pelo contrá­rio: embora com a lembrança do passado, tem os olhos postos no futuro. «Foi uma caminhada longa e interessante», diz ao JL Vasco Teixeira, 53 anos, administrador e director editorial da Porto Editora (PE), criada em 1944 por cerca de 20 professores universitários que se juntavam no Café Piolho, debatendo, entre ou­tras coisas, o estado da educação. Como tinham a sensação de que o Porto não possuía, nesse campo, uma editora de referência, resolveram pôr mãos à obra para a criar.

«O meu pai – conta Vasco Teixeira – foi um desses fundadores, e o que mais se dedicou à empresa, talvez por ser o mais novo. Assim, foi comprando as posições dos restantes sócios e a PE acabou por se transformar numa empresa fa­miliar. Tanto que, no início dos anos 50, a minha mãe veio ajudá-lo no departamento editorial». Mais tarde seguiram-se os filhos: na década de 80, António José Teixeira junta-se ao projecto, dedicando-se ao sector financeiro e comercial; depois Vasco Teixeira, que trabalha na parte edi­torial; e, já nos anos 1990, Graciete Teixeira, que se ocupa da parte dos dicionários. Vasco Teixeira (pai) morre em 1987 e a gestão da editora fica, então, entregue à viúva e aos filhos. Hoje, todos são administradores. Vasco Teixeira (VT) é o rosto da empresa, mas as decisões são tomadas em conjunto, numa «democracia familiar».

As primeiras edições foram aquelas pelas quais a chancela ainda hoje é conhecida: dicionários e enciclopédias. Mas «no início dos anos 80 começámos a diversificar, apostando em três eixos: digital, internacional e não escolar», diz VT. Corria o ano de 1995 quando a editora de­cidiu avançar para o digital. O que hoje se sabe ser uma aposta segura era, na altura, incerta: o Plano Tecnológico de José Sócrates não estava no horizonte, e a ideia de que viesse a existir um computador em tantas casas portuguesas era um mero exercício de futurologia.

Os avanços nas novas tecnologias de informação e comunicação podiam ser, em meados dos anos 90, incipientes em Portugal, mas eram no es­trangeiro eram uma realidade. Depois de vários contactos com outros editores, um pouco por todo o mundo, a Porto decide lançar, em 1995, no mercado os primeiros dicionários digitais, em disquetes. A entrada no multimédia «representou um grande ponto de viragem, pois permitiu agili­zar a produção editorial e modernizar os métodos de trabalho», sublinha o administrador.

Mais tarde decidiram expandir-se para África, onde criaram, em 2003, em Moçambique e em Angola, a Plural Editores. Os seus livros es­tão também em Cabo-Verde e São Tomé, e, no continente asiático, em Timor. «Somos líderes do escolar, do qual detemos 70% do mercado. Por isso tivemos que investir noutras áreas. Foi assim que surgiu, arrancando em 2006, a aposta no não escolar, no qual a ficção detém a parte de leão. Nas divisões literárias (uma em Lisboa, outra no Porto) publicámos cinco livros naquele ano, 20 em 2007 e 60 em 2008. Queremos ser líderes também nesta área. Não será já, mas vamos caminhar para lá», afirma VT.

Para o fazer, a PE conta também com a experi­ência de Manuel Alberto Valente (ver caixa), à frente da Divisão Literária de Lisboa, enquanto Cláudia Gomes chefia a do Porto. E com a orga­nização, dimensão, distribuição e capacidade de chegar a toda a parte, pela força da empresa no sector do livro escolar.

Manuais escolares e dicionários
Os autores dos livros são a face mais visível de uma editora. No entanto, a equipa que todos os dias lhes dá forma não é de menor importância. Fazer e comercializar um livro é um processo complexo, e na «Porto» tudo é feito interna­mente, sem outsourcing. O que explica que na sua sede, na Rua da Restauração, na capital nortenha, trabalhem cerca de 400 pessoas, nas quais se contam inúmeros profissionais nos sectores de marketing, comercial e financeiro que asseguram uma promoção eficaz dos livros.

Se dar corpo a uma obra literária é um processo relativamente simples, o mesmo não se poderá dizer de um manual escolar: «É um processo complexo e moroso, que exige muito rigor e qualidade, bem como um grande trabalho de uma vasta equipa de profissionais», explica José Augusto Nogueira, 57 anos, coordenador edi­torial daquela área. Num grande open space encontram-se várias ‘ilhas’, cada uma corres­pondendo a uma disciplina, desde a Matemática ao Português, passando pela Filosofia e pela Biologia. E por todos os anos de ensino, desde o Básico ao Secundário. E como surgem os manu­ais? «Frequentemente os autores apresentam as suas propostas. Mas também acontece a editora tomar a iniciativa de convidar para os fazes pro­fessores a quem reconhece elevadas capacidades e mérito», diz o coordenador. Uma vez entregue o texto pelos autores, é tempo de consultores cientí­ficos e pedagógicos (alguns dos quais trabalham na sede, outros são colaboradores externos, no âmbito de protocolos com instituições univer­sitárias) reverem o original.

Ao mesmo tempo é necessário escolher ou ‘criar’ imagens para acompanhar e valorizar os textos, o que é feito por uma equipa de designers, ilus­tradores e fotógrafos. O coordenador editorial é, por sua vez, o responsável por articular todo o trabalho, desde a génese até à sua impressão. E como hoje os livros escolares são acompanhados por materiais multimédia, existe ainda estúdios, de fotografia, som e vídeo.

O departamento de dicionários (de português, inglês, francês, espanhol, russo, polaco e japo­nês) situa-se num dos poucos gabinetes fechados do edifício. Dez pessoas, com os indispensá­veis estudos superiores na área da Linguística, complementados com uma formação na área da Lexicografia, trabalham em silêncio, realizando várias tarefas. Que são, refere Ana Salgado, 31 anos, coordenadora editorial do departamento, «introdução de neologismos e eliminação de ar­caísmos, enriquecimento de informação lexical, revisão do conteúdo dicionarístico, etc.». «Como elaboramos dicionários descritivos, analisamos e explicamos as palavras e o seu uso em contex­tos reais. A língua está em constante evolução o que exige uma actualização permanente e imediata», explica. Acrescentando que os di­cionários são elaborados com base «num vasto repositório lexical de várias línguas, tomado sempre como referência para a execução dos diferentes projectos editoriais». Havendo ainda uma «preocupação de registar palavras novas, cuja introdução nas obras lexicográficas depende de uma avaliação do seu uso e frequência no sistema linguístico».

Também na sede se localiza a Wook, a livraria online da editora (e a maior livraria virtual portuguesa). Criada em 1999, recentemente foi tomada a decisão de criar uma rede livreira ho­mónima. A primeira livraria já abriu, no Cen­tro Comercial MarShopping, em Matosinhos. A segunda abrirá em Lisboa, no novo Centro Comercial Dolce Vita Tejo, cuja inauguração está prevista para este mês. Uma rede que se quer que continue a aumentar.

Uma vez pronto o ori­ginal, é tempo de pas­sar, ainda na sede do Porto, à pré-impres­são, para a paginação do livro e as primeiras provas de cor. Tudo aprovado, é altura de o imprimir. O que é feito na Bloco Grá­fico, propriedade da editora, localizada na Maia, com uma área coberta de cerca de 12 mil metros quadrados e no qual laboram 150 trabalhadores que, distribuídos por dois turnos, asseguram que 15 milhões de volumes por ano estejam prontos a distribuir pela rede livreira nacional.

É também aqui que os livros se armazenam em duas enormes estantes robotizáveis, de cerca de 25 metros de altura e 150 de compri­mento, com capacidade para 30 mil paletes. Quando se lhes quer ter acesso, basta indicar num computador a palete desejada e o robot vai buscá-la. De salientar ainda que a gráfica tem uma ETAR própria para eliminar os resíduos tóxicos, bem como um sistema de reciclagem que permite transformar as aparas de papel em novos materiais.

Impresso e encadernado o livro, é vez da fase da distribuição, através também de uma em­presa própria, que chega a um número de pos­tos de venda que parece ultrapassar todas as congéneres, dado o elevado poder negocial da editora, como líder de mercado em segmentos que são os mais rentáveis para a generali­dade das livrarias (ou papelarias/ livrarias). Assim, consegue bom espaço de exposição, bem como grande permanência dos livros, até no mercado extremamente competitivo da ficção. Apesar disso, a aposta no retalhonão é descurada: além das livrarias Wook, a PE tem ainda três livrarias Espaço Professor e quatro livrarias Porto Editora (em Lisboa, Porto e Coimbra).

O contraponto à Leya
As mudanças no sector livro, ocorridas com concentração editorial levada a cabo pelo grupo Leya, que congrega a Texto Editores, a Asa, a Caminho, a Gailivro, a Dom Quixote, a Teorema e a Oficina do Livro, não preocupam a editora nortenha. «Somos o contraponto da Leya, na medida em que somos o único grupo editorial de raiz portuguesa com origem no sector», afirma Vasco Teixeira. «A Leya, está transitoriamente na edição e, mais cedo ou mais tarde, vai ser vendida a alguém que, provavelmente, será es­trangeiro», acrescenta.

Segundo Vasco Teixeira a PE, que já em 2002 tinha comprado duas outras chancelas, a Areal e a Lisboa Editora, «viu o início das compras com muita serenidade e, até, alguma expectativa de que trouxesse mais calma ao sector». «Sente-se que hoje a UEP (União de Editores Portugueses) e a APEL (Associação Portuguesa de Editores e Livreiros) se encaminham para uma unificação», ressalva. Aliás, é conhecida a relação do rosto da PE com a APEL, cujo actual presidente, Rui Beja, é colaborador do grupo. VT chegou mesmo a liderar, no ano passado, a sua delegação nas negociações com a Câmara de Lisboa e com a UEP (União dos Editores Portugueses) por ocasião das polémicas sobre organização da Feira do Livro.

«A actual direcção da APEL tem realizado um bom trabalho, fazendo com que o sector se acalme, o que é muito importante face aos seus problemas actuais: a crise e o digital. A pirataria afecta a industria e a produção intelectual. Digitalizam-se livros, colocam-se textos na Internet sem citar…», lamenta o editor, que considera «muito importante a sensibilização dos responsáveis», acrescentando que «o actual ministro da Cultura não tem sensi­bilidade para o livro».

Mas estes problemas, para Vasco Teixeira, de­vem antes ser encarados como desafios. Por isso, quer que a Porto Editora cresça com uma estratégia direccionada para os serviços de E-Le­arning (ensino à distância, com ajuda das novas tecnologias e plataformas digitais) e B-Leaning (mistura entre o ensino à distância e o ensino presencial): «Estes são os nossos desafios para o futuro. Não se sabe bem o que vai acontecer. Novas questões podem ser colocadas, mas a PE irá, de certeza, estar vanguarda.»"
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