A MOLESKINE DE UM EDITOR- 1 (*),
por Manuel Alberto Valente
Ao receber no Porto o prémio que lhe foi atribuído pelo Clube Literário, António Lobo Antunes, com a delicadeza que lhe é reconhecida, gritou alto e bom som que, em Portugal, os livros são «indecentemente caros». Imediatamente, alguns órgãos da comunicação social repercutiram, em grandes parangonas, o dislate do escritor, apressando-se a fazer comparações entre o preço de determinados livros em Portugal e nos países da nossa envolvência cultural, para chegar à conclusão, claro, de que os preços são mais elevados entre nós.
Evidentemente que estavam a comparar as normais edições portuguesas com edições de bolso, passando por cima de todas as circunstâncias que permitem a estas últimas alcançar preços mais baixos – nomeadamente pelas tiragens muito elevadas, que o (pequeno) mercado português não possibilita.
Se a comparação for feita de um modo sério, chegar-se-á à conclusão de que os preços dos livros em Portugal não variam muito em relação aos que se praticam no estrangeiro – sendo, por vezes, até mais baratos, apesar da diferença de tiragens.
Vejam-se dois casos recentes: O «Millennium I», de Stieg Larsson («Os Homens Que Odeiam as Mulheres»), custa em Portugal 19,50 € e, em França, 22 €; o Gomorra, de Roberto Saviano, custa entre nós 18 € e, em França, 21 €.
Quando se pretende incentivar a leitura e dinamizar o mercado do livro, seria bom evitar certo tipo de atoardas sem fundamento, que desmobilizam os potenciais leitores.
*
Oliver Cohen, o “patrão” da editora “L’Olivier”, é um dos nomes de referência da edição francesa. Entrevistado num dos últimos números da Livres Hebdo, teceu comentários pertinentes sobre a actual crise internacional e os seus reflexos no livro.
Assim:
“Contrariamente ao que se passa noutros países, onde o poder passou das mãos dos editores para as mãos dos financeiros (e dos comerciais), os patrões dos grandes grupos de edição franceses continuam a pensar que os editores são ainda quem deve dirigir as editoras. Apesar das previsões sombrias de André Schiffrin, “a edição sem editores” não está na ordem do dia. Mas a crise económica que explodiu no Outono de 2008 pode desestabilizar a edição e o comércio do livro, à semelhança de outros sectores da economia.
É esse, quanto a mim, o verdadeiro perigo, muito mais do que a erupção do e-book e do numérico. Quando as margens financeiras se reduzem, os industriais tendem a fechar-se naquilo que sabem – ou pensam saber – fazer, em prejuízo da inovação. Um tal procedimento seria mortal para a literatura geral, cuja actividade poderia ser definida como uma oferta sem procura, apoiada na busca permanente de protótipos.”
Assim:
“Contrariamente ao que se passa noutros países, onde o poder passou das mãos dos editores para as mãos dos financeiros (e dos comerciais), os patrões dos grandes grupos de edição franceses continuam a pensar que os editores são ainda quem deve dirigir as editoras. Apesar das previsões sombrias de André Schiffrin, “a edição sem editores” não está na ordem do dia. Mas a crise económica que explodiu no Outono de 2008 pode desestabilizar a edição e o comércio do livro, à semelhança de outros sectores da economia.
É esse, quanto a mim, o verdadeiro perigo, muito mais do que a erupção do e-book e do numérico. Quando as margens financeiras se reduzem, os industriais tendem a fechar-se naquilo que sabem – ou pensam saber – fazer, em prejuízo da inovação. Um tal procedimento seria mortal para a literatura geral, cuja actividade poderia ser definida como uma oferta sem procura, apoiada na busca permanente de protótipos.”
(*) Manuel Alberto Valente é actualmente editor da Porto Editora para a área da Literatura, depois de mais de 17 anos à frente da área de ficção da Asa. É um dos editores mais experientes do nosso sector.
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