quinta-feira, 26 de junho de 2008

Margarida Rebelo Pinto

«... Na altura, percebi que as pessoas gostavam dos meus livros. Em 1999, vendi 70,000 exemplares sem ninguém saber quem eu era. Estamos a falar destes números numa altura em que o mercado estava um pouco agonizante. Percebi que tinha de construir uma imagem, peguei na minha vertente publicitária e disse: 'Agora como é que a construo? Não vou construir uma imagem discreta, porque não sou discreta. Sou mainstream'.

Pop?
Sim, pop. E as pessoas têm de ter a inteligência e a capacidade de transformar os seus defeitos em qualidades. Sempre fui muito transparente e sincera. Isso prejudicou-me várias vezes na vida, mas também faz com que as pessoas acreditem em mim e nos meus livros.
(...)
Quando entro numa loja de bairro ou me perguntam se sou escritora ou então dizem-me: 'Olá Margarida' - é um fenómeno de empatia, uma ligação afectiva que tem mais a ver com o conteúdo dos meus livros, porque as pessoas se identificam com eles. Depois, isso é complementado com a imagem de uma mulher independente, divorciada, que trabalha e cria um filho sozinha. É evidente que essa imagem foi construída e pensada, mas é profundamente sincera. Sou completamente transparente»

Margarida Rebelo Pinto, Tabu, p. 29-30, 21.06.2008. Entrevista conduzida por Vladimiro Nunes.

Alguns breves comentários:

1. Este tipo de postura foi sempre o que mais admirei em Margarida Rebelo Pinto (MRP). A transparência, o facto de não ter problema algum em assumir-se como pop ou mainstream, num meio que nem sempre fica bem dizer tais coisas. É verdade que a própria MRP sabe que proferir declarações deste tipo só contribuem para reforçar a sua empatia e posicionamento face ao seu público. Mas ainda assim assumi-lo é ter a noção de que será ostracizada do círculo literário mais restrito. Se MRP se preocupa com isso ou não, já é outra questão. E o facto de mais ninguém querer ocupar aquele espaço ainda outra.

2. Por muito que isto choque algumas pessoas, fazem falta mais Margaridas à literatura portuguesa. Uma, dez, cem. Para de uma vez desmistificar o que é um livro; para de uma vez por todas, entendermos que o livro é um produto industrial que se rege por ciclos de vida e regras / componentes de mercado adjacentes a outros segmentos. Que o livro compete com todas as indústrias culturais e de entretenimento e que nestas áreas não existem pruridos em ser-se pop ou mainstream.

3. Seguindo a máxima de Manuel Alberto Valente, "publicar o que dá para o que não dá", é certo que faz falta a cada editora uma MRP. Todos aqueles que a criticam, e não são poucos, deveriam lembrar-se disso mais vezes.

(pf)