sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Entrevista: Carlos da Veiga Ferreira (Teorema)

Carlos da Veiga Ferreira é Presidente da UEP e editor da Teorema. Não necessariamente por esta ordem, já que o segundo só vem após o primeiro. Numa entrevista efectuada por e-mail, Carlos da Veiga Ferreira fala-nos da construção do seu catálogo, da Explorer Investments, do que foi mudando na edição.


1.Euclides ensinou-nos que um Teorema era uma afirmação que podia ser provada, acha que a Teorema ainda tem algo para provar ao mercado?

Embora o nome Teorema remeta mais para o filme de Pasolini com o mesmo título, podemos sempre ir também à geometria, para dizer que a casa provou, no passado, que era possível construir um catálogo de elevada qualidade, com poucos meios, mas muito amor e dedicação.
Na nova etapa, tenho razões para pensar que a Teorema continuará a "provar", agora com o apoio de um grupo muito jovem, mas que já tem também muitas provas dadas.


2. Algumas vezes ouvimo-lo dizer que o fantástico catálogo que construiu foi obtido quase sem dinheiro. O que é que contou como moeda de troca durante todos estes anos?

O que sempre tenho dito é que o catálogo, que vocês qualificam de "fantástico", foi construído com pouco dinheiro, se comparado com o que já de há bastante tempo vem sendo usual pagar. Ao longo de todos estes anos, o que fiz, e muito me ajudou foi construir uma rede de grande amizade e cumplicidade com agentes, editores e autores. Essa rede tem-me permitido descobrir autores novos, conseguir clássicos e outros já confirmados também que, em muitos casos, preferem publicar em casas pequenas, mas com um catálogo de qualidade.


3. Como vê as alterações por que o mercado dos direitos anda a passar, onde parece que é o dinheiro que mais manda, fala-se em históricos, em plataformas de acesso, em rentabilidade e parece que o melhor avanço ganha. Será que os rostos de hoje só surgem nas notas e moedas?

No mercado de direitos manda, hoje e principalmente, o que manda em todos os mercados - o dinheiro. Esta é uma verdade universal, e Portugal não poderia ser excepção. O problema é que a competição desenfreada nos pode levar, nestes tempos de baixas tiragens, a cometer erros com pesadas repercussões económicas.
O meu optimismo leva-me, porém, a acreditar que nos será possível, a mim e aos meus colegas de ofício, evitar tais erros.


4. Stanley Unwin dizia-nos que o tempo mais bem passado do editor era com os livreiros, o Carlos Veiga Ferreira concorda ou tem uma visão diferente do tempo dos editores?

Passei de facto muitos e bons tempos com livreiros, quando nesta acepção os havia. As transformações no mundo livreiro foram, contudo, de tal ordem, que receio que os livreiros de hoje pouco tempo tenham para os seus clientes, quanto mais para velhos editores. Muito tempo e útil tenho passado à conversa com leitores interessados e críticos.


5. De que forma passa o seu tempo [profissional]? Quais são as actividades a que mais se dedica e das quais nunca abdicaria?

Até há bem pouco, eu era praticamente o único "fabricante" dos livros da casa e, por isso, tinha que dedicar o meu tempo ao trabalho com agentes, autores, tradutores, revisores, gráficos, imprensa (que sempre nos apoiou), tipografias, papeleiras e tudo o resto.
Mas o grosso do meu tempo foi sempre dedicado à leitura e estou certo de que será essa a actividade de que nunca abdicarei.


6. A Teorema foi sempre uma editora com rosto. Actualmente, a Teorema passou a integrar uma estrutura alargada, com objectivos e características próprias. De que forma irá a Teorema ajustar o rosto às novas necessidades?

O rosto da editora não sou eu, são os rostos dos muitos autores que publiquei. Esses permanecerão sempre.
Estou convicto de que a minha colaboração com os outros editores e estruturas das casas que estão no mesmo grupo, em especial com o António Lobato de Faria, que muito admiro, permitirão afirmar ainda mais no mercado esses rostos, esse rosto.


7. Havendo actualmente vários actores no mercado, o que o levou a decidir-se pela Explorer Investments?

A Teorema, como muitas outras editoras, foi contactada por vários grupos interessados na sua aquisição. O que me levou a decidir pela EXPLORER foi a enorme transparência e seriedade que encontrei nos seus responsáveis, a clareza dos seus projectos e a garantia da manutenção da identidade da casa.


8. Estando à frente da UEP, como acha que todas estas alterações irão afectar o sector associativo?

É muito cedo para fazer previsões. Mas o recente encerramento do longo contencioso com a APEL e as intenções manifestadas pelos representantes dos vários grupos em presença permitem-me esperar o fortalecer do movimento associativo e, a prazo, a sua unificação.


9. Qual é para si o passo seguinte para que o mercado fique mais equilibrado, mais pro-activo e permita a existência de qualidade, prosperidade e especificidade neste sector?

Confesso que não tenho a sabedoria para responder a esta questão, já que as variáveis são tantas e os desafios tão grandes, que uma resposta não passaria de especulação ou "wishful thinking".


10. Se tivesse de sintetizar tudo numa frase, como descreveria os tempos que se aproximam?

No curto prazo, muita perturbação e indefinição; a seguir, consolidação dos vários projectos em presença; no fim, um sector mais próspero, com uma produção diversificada e de qualidade, que nos fará estar à altura de um passado que honra os editores portugueses.