sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Byblos, a análise de José Mário Silva

Sob o título Primeiras impressões, José Mário Silva faz um balanço à experiência Byblos.

Ainda é cedo para formar uma opinião sobre a Byblos. Em dia de inauguração solene, com gente a mais e sem ter experimentado as anunciadas novidades tecnológicas, não foi possível aferir as vantagens e desvantagens do ”novo conceito de livraria”. Eis de qualquer forma, telegráficas, as minhas primeiras impressões.

Aspectos positivos
- O espaço. Amplo, bem pensado, com recantos e nichos que criam pequenos habitats autónomos, dentro do ecossistema global da Byblos. Apesar da imensa extensão da loja, nunca sentimos o seu gigantismo. É como se houvesse várias livrarias dentro da livraria.

- A utilização. É fácil circular e aceder aos livros. A informação está em todo lado (através de plasmas) mas sem ser impositiva. Usando a terminologia informática, este é um modelo user friendly.

- A oferta. Há muito por onde escolher. Muito mesmo. E o que não fica à vista está no armazém, acessível em poucos minutos (se o prometido fundo editorial funcionar). Para já, fiquei com vontade de explorar melhor a secção dos livros estrangeiros, que me pareceu bem fornecida.

- O potencial. Quando estiver a funcionar a 100%, a Byblos pode tornar-se um ponto de encontro para quem não se contenta em dar uma vista de olhos nas novidades. E um perigoso sorvedouro para bibliófilos com cartão de crédito.


Aspectos negativos
- O acesso. Um dos grandes segredos para o sucesso da Fnac foi o facto de ser ter instalado em lugares próximos de estações de metro. A Byblos, pelo contrário, ocupa dois pisos de um edifício na fronteira entre as Amoreiras e Campo de Ourique. Ir para ali de transportes públicos parece-me complicado. Levar carro, idem aspas: faltam lugares de estacionamento nas redondezas e os parques enchem com facilidade (para além de não serem baratos). A haver um calcanhar de Aquiles no projecto, pode muito bem estar aqui.

- A arrumação. A Byblos foi montada em contra-relógio e isso, na primeira noite, notou-se. Se algumas secções estavam impecáveis, noutras percebia-se que foi tudo colocado nas prateleiras a trouxe-mouxe, na vertigem da urgência. Só um exemplo: na estante dedicada aos livros de crónica, estavam os clássicos gregos, mais o Paraíso Perdido do Milton e o Decameron do Boccaccio. Nada que os ajustes dos próximos dias não possam corrigir.

- A menorização da poesia. Numa livraria tão grande, como é que se justifica que a poesia (portuguesa e estrangeira) fique limitada a duas estantes, bem menos do que oferecem as Fnacs? Além disso, a um primeiro olhar, faltam autores fundamentais (Herberto Helder, Fiama Hasse Pais Brandão, entre muitos outros), embora pululem por ali dezenas de fraquíssimas edições de autor. Bem sei que no fundo editorial podemos encontrar o que nos interessa, mas as estantes devem ser sempre um espaço nobre para cativar leitores. Como estão, duvido que entusiasmem um único amante de poesia.

- A importância relativa das secções. Há demasiados best-sellers para o meu gosto, demasiados livros de auto-ajuda e demasiados coffee table books (a ideia é vender, eu sei, mas estes enormes espaços moldados pela ditadura do marketing, com pirâmides de livros por todo o lado, surgem-me como uma forma de poluição visual). Além disso, faz-me espécie ver quatro estantes dedicadas à gestão e duas aos “recursos humanos”, quando a poesia está numa espécie de gueto minúsculo.

- A iluminação. Julgava que este seria um ponto forte, mas o sistema de focos e pontos de luz pareceu-me mais próximo da atmosfera típica dos centros comerciais do que das livrarias cosy, em que uma pessoa gosta de perder horas a bisbilhotar capas, contracapas, badanas e inícios de capítulos.

Resta a questão central: haverá viabilidade económica para uma mega-livraria que também vende CD’s e DVD’s (estes sem desconto), mas não oferece a parafernália de electrodomésticos e gadgets electrónicos que contribui, em larga medida, para o enorme volume de negócios da Fnac?