BIBLIOTECAS, LIVRARIAS E LIVROS UNIVERSITÁRIOS,
por Pedro Patacho (*)
Noticiava o El País, no final de Dezembro de 2009, no contexto de uma entrevista a Camila Alire, presidente da Associação de Bibliotecas Americanas, na altura de visita a Espanha, que nos Estados Unidos existem mais bibliotecas do que McDonald’s, cerca de 16 500 no total, e que mais de dois terços dos norte-americanos têm cartão de biblioteca, sendo que a maior parte são utilizadores assíduos.
Aquele número inclui naturalmente todas as bibliotecas, mas interessa-me aqui deter a nossa atenção nas bibliotecas académicas, situadas no interior dos pólos universitários e, por inerência, essencialmente vocacionadas para a construção de acervos bibliográficos académicos. Estas têm habitualmente, para além de uma política muito activa de pesquisa e aquisição bibliográficas, chorudos orçamentos que lhes permitem estar, com efeito, entre os principais clientes dos editores vocacionados para o público universitário, havendo mesmo editores norte-americanos que nem sequer distribuem as suas edições no circuito livreiro convencional. Outro dado interessante é que, muitas vezes, associadas à rede de bibliotecas de cada campus, estão as livrarias universitárias, cuja organização é reveladora de uma política séria de fomento do livro e de um feroz combate à fotocópia. Entrar pela primeira vez numa livraria universitária norte-americana é surpreendente para qualquer aluno ou professor português. Habitualmente, estes espaços comerciais estão divididos em corredores, que correspondem às áreas de formação existentes na instituição. Em cada um desses corredores, é possível encontrar zonas dedicadas a cada curso e, por sua vez, prateleiras dedicadas a cada unidade curricular do curso, onde se pode encontrar os livros recomendados por cada professor. Acresce o facto de, na maior parte dos casos, o cliente poder optar entre o livro novo e o usado. Há até casos em que, tratando-se de uma obra antiga fora de circulação, são vendidas as fotocópias da obra, acompanhadas de um carimbo da universidade e de uma declaração comprovando que os direitos para a comercialização daquela obra foram pagos e que as fotocópias são, por isso, autorizadas. Algo que por cá até dá vontade de rir... pelo menos foi assim que reagiram algumas das pessoas com quem partilhei estas observações. Não sei se será assim em todas as universidades públicas norte-americanas, mas pelo menos foi o que observei numa dezena de casos que conheci até à data.
À medida que, em Portugal, se reduz o espaço disponível para as publicações académicas no circuito comercial do livro generalista, seria desejável que se ensaiassem novas fórmulas para a comercialização do livro académico na rede nacional do ensino superior. Muitas instituições de ensino superior têm acervos bibliotecários modestos e não possuem qualquer espaço livreiro vocacionado para o público universitário. Fortalecer e expandir a rede de bibliotecas ligadas às instituições de ensino superior, repensar e expandir os espaços livreiros associados a essas instituições e avaliar a possibilidade de uma política de preços alternativa para estes espaços parecem-me questões a necessitar de atenção.
No meio de todo o turbilhão tecnológico em torno do sector editorial, é importante não perder de vista que é no país da Amazon.com e do Kindle que se continuam a fazer crescentes investimentos na rede nacional de bibliotecas, que se pretende fortalecer e expandir, tendo por base o livro em papel, o que não nos revela grande coisa sobre como evoluirá o comportamento dos eBooks no mercado, mas deixa perceber que o futuro do livro, tal como o conhecemos hoje, não será certamente tão sombrio como alguns se apressaram a vaticinar.
(*) Pedro Patacho nasceu em Lisboa, em 1977. É professor de Matemática e de Ciências da Natureza no ensino básico, actividade profissional que desenvolve ininterruptamente desde 1999. Mestre em Educação pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, frequenta actualmente o programa de doutoramento em Educação na Universidade da Corunha, Espanha. Em 2004, sentindo o panorama da publicação académica em Portugal e entendendo a necessidade de um projecto alternativo que oferecesse aos leitores mais possibilidade de escolha, criou as Edições Pedago, essencialmente vocacionadas para a publicação em Educação e Ciências Sociais, onde se mantém como editor e director editorial.
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